(o livro da loucura)

Arrêgo


Rua pequena de vilarejo...

e queria ser Marginal!

Mas, bem no começo,
tem uma igreja, um coreto,
um cortejo beato
e endereço certo.

Não tinha sequer um cortiço,
um corte no pulso,
um Cortázar,

um bêbado na coleira,
mascote do macaco do realejo.

Era uma não-poeta
sem trago
com um não-poema
sem beijo.

Votiva de Nunca

Que, desavisadamente e sempre
chovam tristezas em sua nunca paz

e o poder do seu abraço intenso
nunca evite o transbordar da dor.

Que o gozo não se faça orgasmo,
a mulher dos sonhos
não te satisfaça em nada

e a abundância da mesa à sua frente
nunca vença a fome
ou cesse a sede que te mata.

Que nunca, nunca sintas gosto!

Que não te assustem as distâncias,
sempre vás em busca

e que nunca encontres.

Que, ao voltar de mãos vazias,
a brisa não te alivie as costas
da carga de ser ninguém

e o Sol se negue a aquecer,
em desconsolo,
a impotência do que foi em vão.

Amém.




Demônio do Meio-Dia

Aquela mulher

(velha conhecida nossa)
não o ensinou a sofrer de verdade.

Toma de mim esse copo de Werther
todas as lágrimas,
a sina Tuareg,
essa chuva grossa
de crueldade

e a poesia vai jorrar dos cortes
os imensos incêndios,
rios de esquizofrenia, compêndios,

“Anatomias da Melancolia”
e até mesmo, para sua sorte,

“A Grande Morte”.